A compreensão ou problematização das complexas relações entre método, práxis e filosofia possui um percurso histórico longínquo. Desde a filosofia antiga até a contemporânea, procura-se compreender a realidade, seja para transformá-la, seja para simplesmente compreendê-la, mas o que não muda é o telos ou propósito do homem, que nesta busca almeja encontrar uma vida melhor, e com isto a felicidade, baseando-se numa reflexão que transforme tanto a realidade cognoscível quanto o sujeito cognoscente.
O método pode ter o seu sentido
considerado a partir da compreensão etimológica, onde a junção das palavras
grega meta, através, e hodos, caminho, que representam o
caminho através do qual buscamos um propósito, que orienta o modo de conduzir
uma investigação científica (COTRIM; FERNANDES, 2011, p. 328); no caso da
filosofia representa um procedimento que busca compreender os problemas que nos
são apresentados a partir da realidade da existência humana.
Nos estudos que compreendem a Filosofia “o
método é questão basilar para que possamos analisar crítica e criteriosamente,
as matrizes históricas que dão e deram sustentação à estrutura e à organização
da realidade” (DONIZETE, 2012, p. 41).
A concepção metodológica moderna para a
produção da ciência busca recuperar o espírito grego (p.37), contudo acaba por
produzir um recorte sobre o pensamento, entre científico e filosófico.
Descartes considerava conhecimento verdadeiro somente aquele que fosse evidente,
intuível, claro, e preciso, e, além disto, ele mesmo afirma que havia formado
um método para que ‘conseguisse aumentar de forma gradativa o seu conhecimento,
elevando-o pouco a pouco, ao nível mais alto, superando o conhecimento medíocre
do próprio espírito’ (DESCARTES, 1999, p.36); com isto o autor separou o
conhecimento em um nível inferior e outro de um nível superior.
Ao descrever as formas de conhecimento,
Immanuel Kant também havia o reduzido a somente duas formas, a saber, o
conhecimento a posteriori ou
empírico, e o conhecimento a priori ou
puro, reduzindo assim as possibilidades de conhecimento (KANT, 1999, p. 9),
proposição esta que acaba por nos exigir a demonstração daquilo que conhecemos,
ou seja, a prova.
A lógica que rege o pensamento científico
contemporâneo torna central tal necessidade de demonstração; de modo que a
ciência funda-se, entre outras exigências, na ideia de método ‘como um conjunto
de regras’, normas e procedimentos gerais (CHAUÍ, 1998, p. 278), acrescento
ainda, que nos conduza à um resultado.
O principal objetivo da ciência passa ser,
por meio do uso de métodos, o de confirmar ou falsificar as hipóteses
levantadas sobre determinado experimento ou objeto. Na mesma linha afirma
Japiassú e Marcondes que o método é o “conjunto de procedimentos que visam
atingir um objetivo de terminado” (2001, p. 181). Do mesmo modo, ao final da
Crítica da Razão Pura, Kant afirma que se poderíamos nomear algo como método,
deveria ser um ‘procedimento segundo princípios’ (1999, p. 504).
Do mesmo modo, o professor Marcelo
Donizete afirma “a filosofia deverá ter clareza dos problemas reais existentes
em nosso contexto histórico. Daí a necessidade do método como critério de
investigação e produção do pensar humano” (DONIZETE, 2012, p. 36).
O método nos auxilia na busca pela
objetividade da pesquisa, mas também na apresentação dos resultados da
pesquisa. É um caminho, mas não “o caminho”, a ser seguido na tentativa do
filósofo de construir e problematizar a pergunta. As perguntas se tornam
pesquisa, e a pesquisa, objeto de reflexão filosófica. Sendo que a reflexão “é
o ato de retomar, reconsiderar os dados disponíveis, revisar, vasculhar, numa
busca constante de significado” (SAVIANI apud
DONIZETE, 2012, p. 42).
O papel da filosofia na produção do conhecimento
é o de buscar a certeza, por meio da reflexão fundamentada no rigor técnico do
método, submetendo e discutindo a doxa,
opinião, senso comum, transformando-o em episteme,
que embora tenham diferentes sentidos, é marcado pela oposição a doxa, indicando um novo tipo de
conhecimento, fruto da technné (JAPIASSÚ;
MARCONDES, 2001, p. 84; DONIZETE, 2012, p. 42).
A filosofia sob diversas perspectivas
produziu algum tipo de práxis em sua reflexão. Em Platão encontramos uma
preocupação em transformar o saber em benefício dos habitantes da polis; o filósofo francês Descartes
buscava encontrar na sabedoria produzida pela filosofia, um uso para a vida;
Kant intentava encontrar como finalidade a felicidade humana; já Marx buscava,
por meio da reflexão aliada à ação, transformar a realidade para produzir
justiça e felicidade para todos; tanto que o jovem Marx, em A ideologia alemã,
critica a concepção de história dos hegelianos e a distinção que estes fazem
entre os homens e animais, atribuindo-lhes diferença pelas consciências e
religião, mas o fundamental e que distingue o homem dos outros seres é mesmo a
sua capacidade de produzir seu modo de subsistir (MARX, 2009, p.24).
Percebemos que o método, em determinado
momento histórico, passa a auxiliar a filosofia na produção de objetividade da
práxis. A práxis é uma ferramenta, do pensar e do agir, pela qual se torna
possível pensar a realidade humana, tornando-nos conscientes das concepções de
realidade e de suas ideologias; possibilitando “a análise de transformação do
contexto real” (DONIZETE, 2012, p. 49).
É na consciência de nossa historicidade,
que ultrapassamos o senso comum da realidade, e como afirma Gramsci (ALMEIDA, p.2),
superamos o senso comum e encontramos o bom senso. A nossa historicidade, a
consciência que temos dela, será a condição para efetivamente criarmos as
possibilidades da crítica da realidade que desvela a contradição que existe na
história e na realidade. Deste modo, seria o homem concreto analisando sua
condição concreta, buscando refletir sobre as ações humanas, especialmente
sobre o seu saber e o seu fazer.
Referencias Bibliográficas
ALMEIDA,
Natália Regina de Almeida. Aspectos da
filosofia da práxis: conteúdo e método. UERJ: Rio de Janeiro. In: http://www.nufipeuff.org/seminario_gramsci_e_os_movimentos_populares/trabalhos/Natalia_Regina_de_Almeida.pdf. Acessado em 09 de março de 2013, às 22h: 00min.
COTRIM,
Gilberto; FERNANDES, Mirna. Fundamentos
da filosofia. São Paulo: Saraiva, 2011.
DESCARTES,
Rene. Discurso do método. São Paulo:
Nova Cultural, 1999. (coleção pensadores).
KANT,
Immanuel. Crítica da razão pura. São
Paulo: Nova Cultural, 1999. (coleção pensadores)
MARX,
Karl. A ideologia alemã. São Paulo:
Expressão Popular, 2009.
SILVA,
Marcelo Donizete da. Metodologia da
pesquisa filosófica: Batatais: Ação Educacional Claretiano, 2012. (Unidade
I)